terça-feira, 19 de agosto de 2014

Livro de Ouvir , Brinquedo de Voar

Quando em 1829 o pedagogo e professor de música francês LOUIS BRAILLE ( 1809-1852 ) criou uma linguagem específica para os cegos ( a linguagem hoje leva o seu nome e passou a ser adotada em outros países a partir de 1879 )  ele não estava apenas facilitando a vida e sendo solidário com aqueles que sofriam , e sofrem , o mesmo drama ( ele se tornou cego com apenas 3 anos de idade ) mas também estava provando que os portadores de deficiência também podem ter uma vida normal , realizar e sonhar . O escritor JURA ARRUDA teve uma experiência bastante gratificante com um grupo de crianças portadoras de deficiência visual  e compartilha conosco esse momento único na crônica de hoje . CONFIRA :

"As crianças sentaram em semicírculo e pareciam curiosas . Eram poucas . O sol invadiu a sala e incomodava alguns  , que se moveram para a sombra . Uns tinham baixa visão , outros nenhuma . A Juliana deu início ao encontro . Falou sobre livro e autor . Falou sobre o brinquedo que os aguardava do lado de fora . Houve burburinho . O autor ( FOTO ABAIXO )



 contou que havia escrito algumas histórias , e que a mais recente era fruto de uma tarde de verão  no litoral . Poucos minutos depois , a história de Rico ecoava pela sala da AJIDEVI - Associação Joinvilense para a Integração dos Deficientes Visuais . ( FOTO ABAIXO )



Percebíamos os ouvidos atentos e as expressões marcantes  em cada um daqueles rostos durante os quase quatro minutos de história .

 ' Que história bonita ' , diziam uns ; ' Que história legal ' , diziam outros , até que Luana , a mais velha  da turma , exclamou : ' É uma história maravilhosa ! ' . Rico é um papagaio que tem a asa quebrada e não pode voar  ,



 personagem principal do livro ' O Vento Que Me Voa ' , que além de impresso , é história contada em áudio . Depois de produzir alguns exemplares em braile do primeiro livro , ' Fritz , Um Sapo Nas Terras Do Príncipe '  ,



 o áudio book do novo livro pareceu ser mais um passo rumo à acessibilidade .

 Logo depois , fomos para o pátio , onde Rico , o simulador de voo , aguardava . As crianças estavam agitadas e foram uma a uma sendo alçadas para receber o vento no rosto  e a sensação do voo . ' Eu tô voando ' , era o que ouvíamos a cada criança que girava no brinquedo . Eram todos Ricos , eram todos pássaros livres .



 Era eu também um pássaro livre naquela manhã de sol ameno . Foi quando me dei conta de que Juliana e eu estávamos realizando : uma ação simples , uma história pequena  e um brinquedo manual que formava o quadro de sonho realizado . Não o das crianças , mas o do autor do livro  e da produtora , que sentiram , com o  perdão da soberba  , orgulho do feito .



 Uma professora aproximou-se e perguntou se havia uma edição do livro em braile .



 Respondi que não , que havíamos decidido fazer uma versão em áudio . ' Seria melhor em braile , para estimular a leitura ' , comentou . Senti-me triste porque tudo parecia tão perfeito  até ali . Calei . Em casa  pus-me a pensar sobre tudo isso . Uma versão em braile será bem vinda , mas não penso que a versão em áudio deixa de estimular a leitura . Pelo contrário , as primeiras histórias que ouvimos foram verbalizadas por nossos pais , tios , avós . Uma boa história é sempre capaz de fazer voar ,



 seja lida , contada ou apenas sentida , como o vento , que é real ,mesmo quando gerado por um voo de brinquedo . "

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