quarta-feira, 25 de maio de 2016

Uma Grande Ironia.....

Uma cena outrora corriqueira e cada vez mais rara já há cerca de dez anos teve lugar no bairro Bucarein naquele dia de outubro do distante ano de 1974 : um navio ( ABAIXO ) trazendo um carregamento de sal procedente do longínquo Estado do Rio Grande do Norte atracava no velho porto local , em funcionamento desde 1927 ( o navio teve que trazer apenas metade do carregamento de sal para pudesse chegar ao porto ) .

É muitíssimo provável que a pessoa que conduziu o navio e as poucas pessoas que trabalharam na operação de descarga do valioso produto vindo de tão longe , assim como quem testemunhou essa cena , tivessem consciência de que isso estivesse acontecendo pela última vez e que um capítulo importantíssimo da história de Joinville estava chegando ao fim  ......( ABAIXO , PEQUENO PORTO QUE EXISTIU ONDE HOJE ESTÁ O MERCADO PÚBLICO . A FOTO É DE 1870 )

O navio em questão era o CATARINA : talvez o maior navio que já operou nos portos de Joinville ( hoje isso é inimaginável e até espantoso , mas já houve um tempo em que Joinville teve 4 portos : o do Mercado Público - ABAIXO - , que durante muito tempo se estendeu da altura da rua Sete de Setembro até o Moinho e que acabou sendo desativado por volta de 1964 para a construção de uma ponte ;

 o do Bucarein , onde atualmente está a ponte Mauro Moura - ABAIXO - , nome de um importante líder político oriundo e morador daquele bairro ;

o do Morro do Ouro , onde hoje está uma das cabeceiras da Ponte do Trabalhador - ABAIXO - e que funcionou entre as décadas de 50 e 60

e um porto privado , pertencente à Fundição Tupy - ABAIXO - , junto à essa empresa e que entrou em operação a partir de 1950 ) ,

 pertencia à companhia marítima URBANO GERN E FILHOS  e foi construído na cidade alemã de Luebeck ( ABAIXO ) , tendo sido inaugurado em 1954 com muita festa , discursos e pompas que aquele momento exigia ( em 1975 o navio seria adaptado e transformado em uma embarcação pesqueira ) .

Exatamente 20 anos depois a situação era completamente diferente e vários fatores tornavam a NAVEGAÇÃO FLUVIAL EM JOINVILLE ( ABAIXO , O ANTIGO PORTO DO MERCADO  ) - tão vital para o surgimento da cidade e o seu desenvolvimento - algo cada vez mais insustentável :

a equivocada - para não dizer BURRA - política nacional de valorização do caro , perigoso e poluente transporte rodoviário em detrimento dos baratos e seguros transportes fluvial e ferroviário ; a estrada ligando Joinville a São Francisco do Sul , aberta em 1938 mas que só seria asfaltada 30 anos mais tarde ; o cada vez mais precário , abandonado e obsoleto porto do Bucarein , com o seu velho trapiche de madeira caindo aos pedaços e , é claro , o longo e centenário processo de depredação do rio Cachoeira e suas margens , com o seu leito em processo cada vez mais acelerado de assoreamento e agravado pelo aterro definitivo do CANAL DO LINGUADO ( ABAIXO ) , concluído em 1935 ( ver texto ERA UMA VEZ UM RIO....., postado em 19 de maio ) .........

      E o fim há tanto tempo anunciado não demorou a vir : alguns meses depois daquela cena que descrevemos há pouco , uma empresa vizinha ao antigo porto bloqueou o acesso à ele e não muito tempo depois - em 1978 - o porto privado da Tupy era desativado . Marinheiros ; capitães ; estivadores ; arrumadores ; cargas ; madeireiras ; agências marítimas ; autoridades , figuras ilustres e esperançosos e ao mesmo tempo angustiados imigrantes que chegavam à cidade pelo rio Cachoeira , tudo isso era agora uma remota lembrança .......( ABAIXO , ANTIGA ESTAÇÃO DE EMBARCAÇÕES À VAPOR QUE EXISTIU NA ALTURA DA RUA SETE DE SETEMBRO ATÉ A DÉCADA DE 30 )

Ainda se tentou  recuperar o que estava irremediavelmente perdido : por força de mais um desses absurdos causados pela incompetente e lerda burocracia brasileira , foi só em 1976 que o DEPARTAMENTO NACIONAL DE RIOS E VIAS NAVEGÁVEIS acabou liberando uma draga para o rio , o que deveria ter ocorrido em 1974 ! Um longo trecho , entre o Mercado Público e o Morro do Ouro , acabou sendo dragado mas de nada adiantou : até nos trechos mais profundos do rio o assoreamento foi tão grande , que seria necessário reiniciar todo o serviço já feito  e em 1977 os serviço foi definitivamente abandonado . Como se não bastasse , a draga ( ABAIXO ) enviada para o serviço , da marca THIERS FLEMIG , apresentou constantes falhas mecânicas.......

Cerca de dez anos anos já se tentara salvar o porto : um projeto de 1965 previa , para o início do ano seguinte , a construção de um novo porto , mais especificamente onde hoje está a cabeceira do lado do bairro Boa Vista da Ponte do Trabalhador . Antigas famílias que surgiram justamente em função da atividade portuária ( sempre valerá lembrar que antes mesmo da fundação oficial de Joinville já havia um pequeno porto , exatamente no local onde hoje está a ponte Mauro Moura e que era utilizado pelos moradores da gigantesca fazenda pertencente ao coronel ANTÔNIO VIEIRA e que existia onde hoje é o bairro ITAUM - ABAIXO , O RIO ITAUM ) ,

 velhos casarões , um peça chamada HABITA e que está no antigo CAIS CONDE D´EU , um guindaste em frente a antiga fábrica da Stein , lembranças de antigos moradores , antigos trabalhadores do porto ainda vivos , o velho SINDICATO DOS ARRUMADORES DE JOINVILLE ( fundado em 1931 e que hoje atua principalmente no setor atacadista - ABAIXO , PARTE DA FACHADA DO ANTIGO SINDICATO , LOCALIZADO NA RUA PADRE KOLB , NO BUCAREIN )

e seu quase abandonado arquivo de velhos e empoeirados documentos , velhas e amareladas fotografias , tudo isso foi o pouco que restou da época em que o Bucarein era o verdadeiro coração ( ou seria cérebro ? ) de Joinville .......( ABAIXO , O NAVIO " CATARINA "  ATRACADO NO ANTIGO TRAPICHE DO BUCAREIN )


        Em 1907 , época em que o rio Cachoeira já tinha sérios problemas de navegabilidade e era constantemente dragado , surgiu uma pergunta que motivou acaloradas discussões na então pacata Joinville : POR QUE NÃO TRANSFERIR O PORTO DO RIO CACHOEIRA PARA A LAGOA DO SAGUAÇÚ ? ( ABAIXO , FOTO DO ANTIGO PORTO DE JOINVILLE , DATADA DE 1920 )

A história também é feita de ironias e por uma dessas incríveis coincidências isso viria a acontecer mais de 8 décadas mais tarde , mais especificamente em 1988.......Só que ao invés daquele burburinho , típico dos portos , em que verdadeiros exércitos de homens desdobram-se nas operações de carga , descarga e no transporte de valiosas mercadorias que representam boa parte das riquezas de um país , um outro tipo de burburinho : o de maravilhados - para não dizer abismados - turistas . Aliás como não ficar maravilhado, ou abismado ,  com a fantástica  BAÍA DA BABITONGA ? ( ABAIXO )

 Naquele ano de 1988 e partindo do trapiche do bairro Espinheiros - inaugurado em 1978 - , tiveram início os passeios a bordo do iate PRÍNCIPE DE JOINVILLE . Tratava-se de uma velha embarcação de pesca , com capacidade para 65 passageiros e que realizava um percurso muito semelhante ao realizado pela atual embarcação ( este escriba teve a oportunidade e o privilégio de participar de um passeio escolar rumo a São Francisco do Sul a bordo dessa embarcação , em novembro de 1991 ) . A ousada e feliz iniciativa deu tão certo ( anteriormente , entre 1969 e 1973 , um iate chamado CARIJÓ - ABAIXO -  fez passeios turísticos entre o antigo Cais Conde D´Eu e São Francisco do Sul )

  que em 1992 a velha embarcação acabou sendo substituída por outra : uma escuna com capacidade para 30 pessoas e que tinha o nome de PRÍNCIPE DE JOINVILLE 2 ; já a atual embarcação ( ABAIXO ) entrou em funcionamento em 1998 , após 5 anos de construção .

O vídeo do dia conta mais um pouco a respeito dessa mais do que louvável iniciativa e é mais uma das incontáveis demonstrações de que com inteligência , planejamento e muita visão Joinville pode vir a ser sim um pólo turístico , além de voltar de novo os seus olhos para o mar e ter de novo um porto ......VALE A PENA CONFERIR ! ( ABAIXO , CATAMARÃ QUE NAVEGOU NO RIO CACHOEIRA NA FRACASSADA TENTATIVA , ENTRE 2008 E 2010 , DE SE REATIVAR O TRANSPORTE POR ESSE RIO )

Um comentário:

  1. A região do porto do Bucarein era uma verdadeira região portuária. Havia até cabarés frequentados por marinheiros.

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