quinta-feira, 9 de maio de 2013

momento lírico

ESCRITURA DAS VIAGENS NO PAPEL As malas estão prontas. Cabem em seus reservados, restos de um carbono indigesto. Os invasores da escrita andam sobrecarregados de tinta. Querem que a palavra se encaixe em qualquer compartimento, mas a inspiração lhes rouba a delicadeza do grafite. A imagem almeja o sangue azul das canetas, desvirginando papéis. Neles, os muros e as casas assinam alguém que ama. Em volta, o pensamento hospeda vontades: homem e deus nascem na estrebaria do Verbo. Como ordenar sentenças, se o ímã do desejo aguarda bússolas? Os viajantes não descansam a solidão nem suas pedras à beira do caminho. Não há poema que lhes oriente ou lhes vingue, porque os paradeiros do dizer vêm de molas, sem as malas. Elas se extraviam. O branco do olho vê os mapas da viagem. O texto nacarado é solidário, e o poeta, um arrebanhador de pérolas. A língua umedece vocábulos e pára nas esquinas. Saboreia a linguagem dos aventureiros que chegam a lugar nenhum, porque vivem desgarrados de sentido. Tenta articular o som dos pés que partem, mas chega a sós nas frases inacabadas. Entre os esboços e uma janela, qualquer escrito nasce prematuro. Criaturas são incorreções à procura de páginas.

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