terça-feira, 31 de dezembro de 2013

Ecos do apito do trem

Grandes artistas bebem em excelentes fontes......no mundo da música são inúmeros exemplos:RAUL SEIXAS que "bebeu" ELVIS PRESLEY,RENATO RUSSO que "bebeu" o escritor português FERNANDO PESSOA,TIM MAIA que "bebeu' o contagiante e dançante SOUL NORTE-AMERICANO....e na literatura JURA ARRUDA ,que "bebeu" ADÉLIA PRADO.........Ex-professora,a escritora mineira destaca o bucolismo e o aspecto lúdico que ainda existem nos grandes centros urbanos e foi uma das primeiras figuras da literatura brasileira a destacar o papel da mulher na sociedade.O texto a seguir ,de autoria de JURA ARRUDA e inspirado nos textos de Adélia Prado,mostra cenas que vão se tornando cada vez mais coisa de um passado distante, época em que um dos poucos momentos de tumulto era causado pela passagem de um trem.....CONFIRA: "Setecentos metros.Essa é a distância da estação de trem até a casa do Juarez.Uma casa de madeira bem construída,imponente apesar de seus 64 anos. Há um quintal no fundo ,cheio de espaço,cheio de árvores,há um muro alto que separa todo o ar bucólico do mundo urbano lá fora. Há três cachorros soltos correndo para lá e para cá. Há um varal,um tanque com roupa de molho e uma máquina de lavar esperando vontade. Uns passos mais e há a cozinha:ampla ,sempre movimentada,provavelmente pelo apreço da dona em cozinhar mil iguarias,que exalam odores e convites. Dois degraus adiante e aí está o Juarez, na sala.Esparramado no sofá,assiste a um programa tolo ou a filme qualquer.Leva essa vidinha ociosa de quem já fez os afazeres e relaxa. O irmão está sentado na poltrona,vegeta. No quintal um dos cachorros está deitado com a barriga no cimento para amainar o calor.Você vai pensar que são gemidos de prazer os que ele começa a soltar,mas não.Seus ouvidos apurados captam a aproximação do trem.Só ele sabe disso.Geme fraquinho,geme incomodado,geme com medo,por fim,uiva.E seu uivo desencadeia uma corrente de reclamações e gritos de quem não estava preparado para som tão agudo. A mãe de Juarez grita da cozinha mandando o cachorro ficar quieto;o irmão tomado de susto,grita com minha mãe;o trem se aproxima com sua dezenas de vagões e apita;Juarez ,incomodado,aumenta o som da televisão. O pai reclama. Sim,o fuzuê está armado naquela casa de madeira,com amplo quintaL,cheio de espaços e árvores. Por lá,neste momento,cachorros uivam e latem,pessoas reclamam e gritam,o trem apita e passa. Passou.O cachorro se aquieta,a mãe de Juarez se cala,o irmão se ajeita,Juarez diminui o volume da televisão,o pai suspira e um pássaro canta. Tudo volta ao normal.E o normal ,naquele quintal,é uma vida de interior,bucólica,onde um vento suave balança as folhas das árvores,onde as sombras desenham descanso no chão,onde uma mosca posada no focinho de um dos cachorros sequer o incomoda. E tudo será assim,nos dias de semana,nos sábados e nos domingos,exceto nos momentos em que o trem de novo passar por ali e,atravessar a noite,a madrugada,o dia ,a vida das pessoas e virar sentimento,como bem sabia Adélia Prado."(FOTO ABAIXO)

Nenhum comentário:

Postar um comentário