"Poderia ser apenas mais uma quinta-feira , como todas quando Florianópolis é o destino de trabalho , e espio a paisagem naquela curva à esquerda , em São Miguel ( FOTO ABAIXO )
onde sempre há uma bateira ancorada e ao longe se vê parte da ilha e seus contornos
que sobem ao céu . Só que é outono , só que o mar , liso e acariciante , está tão incrivelmente azul e tanto reflete que ficava impossível não concordar com Fernando Pessoa , ( FOTO ABAIXO )
e algo sussurra : ' Mas foi nele que inspirou o céu '.
Há dias , e são a maioria , que o vento levanta aquelas ondas curtas de altura e de distância entre elas na água que separa ou une ilha e continente
e o fundo lodoso se mistura à superfície e aparece outra beleza de contraste e nostalgia . Não que seja triste - cinza não é triste , é apenas cinza - , mas há em nós a necessidade de segurança trazida pelo que e claro , decifrável aos olhos e sentimentos , talvez para compensar os labirintos mais tenebrosos de nossas mentes .
Em dias assim , as cores da bateira ancorada , embora destoem do entorno , pouco aparecem .
Falta-lhes o brilho do reflexo . Na quinta-feira , no entanto , há um vermelho-pescador e um amarelo-navegar-é-preciso flutuando sobre o anil . Visto de cima , da entrada , daria bela aquarela , uma foto tocante de Lair Bernardoni ( FOTO ABAIXO )
( onde anda você ? ) , um anúncio de viagem inesquecível . Mirando da margem , no nível do mar , é nave errante buscando contornos no horizonte .
Velho CD de Renato Teixeira ( FOTO ABAIXO )
embala o caminho e adia a escolha de sempre : ' Pela Via Expressa ou pelo Estreito ' . Pura coincidência : ' O velho barco toda vez que vê o mar , fica confuso , com vontade de parar ' . O trânsito no Estreito , ( FOTO ABAIXO )
de tão tranquilo , parece desenhado para não estragar a paisagem nem as lembranças . De cima da ponte com pouco movimento , extensões de azul , de novo , convidam o pensamento ao voo .
Há um velho barco dentro de nós ,
um barco de sentimentos confusos , de medos e desejos , que prefere navegar ,mas não sabe se prefere fixar-se à âncora ou enfrentar as ondas , se espera pelo vento ou vai com ele , mas , enfim , navega , ' mesmo que o casco seja corroído ' , como continua a canção , porque há o chamado do horizonte , e segue até transmutar-se em ponto , em azul . Libertar-se . "
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