segunda-feira, 6 de janeiro de 2014
Momento Lírico: Distanciamento
Nem só de palavras belas e imagens lúdicas é feito um poema.Ele também pode ter forte teor social.Após certo tempo a poetisa RITA DE CÁSSIA ALVES retorna ao ALAMEDA CULTURAL com um poema que, além do teor social, é comovente.CONFIRA:
"Dois seres na rua ,um só abandono.Miséria exposta.
Seu Felinto e Pequeno ciscavam o lixo. Os dedos de um eram o prolongamento do olfato canino.Quem era o mais extraviado:o cão ou o homem?
Dois cansaços carregados e todos os ombros sem descanso.Pelas ruas pés e patas denunciam e mendigam.As mãos possuem um mapa de fome e miséria entre os dedos.Quem se entristece pela ausência da presença: o homem ou o cão?Faca sem ponta,lâmina de desespero.
O instrumento da delicadeza vem como prato frio,agasalho entregue,papelões cedidos,restos de um afeto demonstrado.
O desejo é uma porta escancarada:há sempre um cuidado por trás de uma janela solitária.Alguém olha e segue com o coração indiferente.Muitos nem se viram,compadecidos,porque o desapego vem acompanhado feito terreno baldio.Eles soletram distanciamento.
Algumas portas se abrem,mas ninguém lhes dá as chaves do estar livre,alimentados.
São seres despojados,eu os vejo do lado de dentro.Aqui permanecem o conforto e as cadeiras vazias.A resposta dentro quer aproximação.O amor é autônomo."
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário