Por acaso você anda tendo uma relação conflituosa com essa dama tão difícil , caprichosa e temperamental chamada LÍNGUA PORTUGUESA mesmo coma sempre providencial ajudo do corretor ortográfico de seu computador ? Não tem a mínima ideia do que é um SUJEITO INDEFINIDO de uma frase , uma PAROXÍTONA , um PRONOME INDEFINIDO ou um ADVÉRBIO ? Tem dificuldades ao julgar determinados verbos , vergonha ao dizer qual é o AUMENTATIVO da palavra DACUEBA ( eita palavrinha sacana ! ) , não sabe se o plural de CIDADÃO é CIDADAÕES ou CIDADÃES , não sabe a diferença entre SEÇÃO e SESSÃO e tem calafrios ao lembrar-se das verdadeiras sessões de TORTURA que eram as aulas de Português no tempo da escola ? Se esse é seu caso e você ficou ainda mais confuso , ou confusa , com a mais recente alteração ortográfica na língua portuguesa , datada de 2008 e em vigor desde o ano seguinte , então ACALME-SE ! Veja o que escreveu o autor da crônica " NASCER NO CAIRO , SER FÊMEA DE CUPIM " , escrita lá atrás , em 1960 : " Conhece o vocábulo escardichar ? Qual o feminino de cupim ? Qual o antônimo de póstumo ? Como se chama o natural do Cairo ? O leitor que responder 'não sei ' a todas estas perguntas não passará provavelmente em nenhuma prova de português de nenhum concurso oficial . Mas , se isso pode servir de algum consolo à sua ignorância , receberá um abraço de felicitações deste modesto cronista , seu semelhante e seu irmão "......Mais ao final da crônica esse cronista arremata : "No fundo o que esse gramático deseja é tornar a língua portuguesa odiosa ; não alguma coisa através da qual as pessoas se entendam , mas um instrumento de suplício e de opressão que ele , gramático , aplica sobre nós , os ignaros ....." . O autor dessas sábias , verdadeiras e atualíssimas palavras não era qualquer um , aliás , muito pelo contrário : trata-se do capixaba- da cidade de Cachoeiro do Itapemirim - RUBEM BRAGA ( 1913-1990 ) , um dos maiores cronistas brasileiros de todos os tempos ! Embora faça parte , de maneira indiscutível , da seleta galeria de mestres da literatura tupiniquim ele , muito humildemente , JAMAIS SE CONSIDEROU UM ESCRITOR ( em entrevista para o jornal O ESTADO DE SÃO PAULO , publicada em outubro de 1987 , chegou a declarar o seguinte : " Nunca pretendi fazer uma obra literária , nunca nem sequer planejei um livro . " ) . Os fatos , porém , o desmentem......Durante sua infância e adolescência apenas uma coisa era capaz de superar o seu interesse por futebol e natação - ESCREVER - e seus textos eram tão bons que não só seus colegas de escola mas também professores duvidavam não só de sua autoria como até de sua própria inteligência ( certa vez um "jeniau " professor de matemática chegou a chamá-lo de burro ! ) . Viver da escrita ? No Brasil , como infelizmente também hoje , isso era algo reservado a alguns raros privilegiados e o jeito foi escolher uma profissão dita " respeitável " .
Vivendo em Belo Horizonte , formou-se em Direito e pouco exerceu essa profissão : sua verdadeira vocação e paixão , tão grande e intensa quanta a escrita , era O JORNALISMO e ainda como estudante de Direito iniciou uma longa carreira que duraria quase 7 décadas escrevendo para uma coluna diária que tinha no jornal belo horizontino A TARDE ( anteriormente chegou a escrever para um jornal pertencente a seu irmão ) . Como jornalista trabalhou em inúmeros jornais , cobriu eventos históricos importantíssimos ( entre eles , a Segunda Guerra Mundial , experiência que acabou virando um livro ) e chegou a viver no exterior - Paris e Santiago - , onde foi correspondente e representante de vários órgãos de imprensa . Além do jornalismo , Rubem Braga também chegou a exercer , por breves períodos , as carreiras televisiva ( foi roteirista ) e diplomática ( foi chefe do Escritório Comercial do Brasil em Paris , nos anos 50 , e foi embaixador no Marrocos , entre 1961 e 1963 ) e após radicar-se no Rio de Janeiro , cidade que amava ( foi um dos poucos intelectuais contrários á transferência da capital federal para Brasília e chegou a escrever uma crônica a respeito disso e intitulada " NÃO VOU PARA BRASÍLIA " ) , pôde enfim se dedicar exclusivamente à literatura ......Um jeito sisudo e com ar de poucos amigos , até mesmo carrancudo : quem não conheceu Rubem Braga e hoje vê fotos suas até custa a acreditar que esse mesmo sujeito adorava ficar sentado sob a sombra das árvores , era apaixonado por pássaros e na cobertura do prédio em que vivia - em Ipanema - cultivava um mini pomar , com pés de manga , romã , carambola , pitanga ......É claro que essa paixão pela mãe natureza acabou influenciando suas crônicas , que eram um misto de psicologia , lirismo , bom humor , melancolia , existencialismo , recordações e descrições de paisagens . O escritor , cujas grandes obras foram " AI DE TI , COPACABANA " ( 1960 , livro do qual faz parte aquele crônica citada no início deste texto ) e " A TRAIÇÃO DAS ELEGANTES " ( 1967 ) , em entrevista para o JORNAL DO BRASIL , em abril de 1988 , definiu a função de ser escritor da seguinte maneira : " É um verdadeiro crime um home m ficar dentro de uma sala escrevendo , sob luz artificial , quando lá fora a tarde ainda está clara e há mulheres andando . " .......Se o sujeito dono do respeitabilíssimo currículo que acabou de ser exposto julgava ser desnecessário saber a língua portuguesa ao pé-da-letra , literalmente , o que dirão nós , pobres e simples mortais que vivemos "apanhando" da língua portuguesa ? Um professor de nome esquisito - ANTONOMÁSIO - com certeza discordaria disso ! O próprio nome do protagonista da crônica a seguir já dá uma ideia de quem é o seu autor : é claro , que só podia ser ele , o sempre irreverente HILTON GORRESEN ! ......BOAS RISADAS !
"Já resolvi, não saio mais à rua com o professor Antonomásio ( ABAIXO ) , meu assessor para
assuntos gramaticais.
Aquele que, depois de aposentado, passou a atormentar a
vizinhança com sua vigilância gramatical, não perdoando a mínima distração ( vamos
dizer assim ) ortográfica ou algum pequeno desvio sintático.
Introduziu na pobre
comunidade uma plêiade ( palavras suas ) de vocábulos estranhos : solecismo,
barbarismo, cacofonia ( esse último, quando o Zé Fuxico - ABAIXO - falou ' meu genro toca gado
no sertão ' ).
Alguns conhecidos, ao avistá-lo, já mudam de calçada. Comentam : lá vem o
doutor Solecismo. Outros até deixaram de me cumprimentar ( Que culpa tenho eu ?
Apenas forneci ao professor um meio de ampliar seus magros rendimentos ).
Nesta semana, acompanhei-o ao quiosque ( ABAIXO ) , no centro da cidade, onde ficamos
saboreando um mate gelado.
Vai daí quando um surdo-mudo ( ABAIXO ) deixou nas mãos do
mestre um daqueles folhetos em que pede ajuda monetária. Vaidoso, o professor
Maso achou que era para corrigir o texto e devolveu-o todo riscado com caneta
vermelha.
Aí aconteceu um milagre: o surdo-mudo encarou o professor e falou ( Aleluia ! Ele
falou ! ) : vai riscar as costas da mãe. Bem, não foi costas que ele falou, foi outra coisa.
Em consideração ao professor, procurei ( ABAIXO , HILTON GORRESEN ) fazer uma adaptaçãozinha.
Como se isso não bastasse, ao passar por uma loja ( ABAIXO ) o professor parou diante de
um cartaz, o que sempre costuma fazer. Ali estava escrito : ' SEJA BENVINDO ' . ' Bem-
vindo ' sem hífen, exclamou o professor, é nome de pessoa. E entrou furioso na loja.
Quando divisou o gerente ( ABAIXO ) foi logo cobrando: onde está o hífen ? Claro, o gerente
não deveria ter dado aquela resposta malcriada ( Ou será mal-criada? De novo o
problema do maldito hífen. Esse desastrado Acordo Ortográfico só complicou as
coisas ).
O professor Maso sacou sua palmatória ( ABAIXO - era desse tempo, e quando se
aposentou levou a palmatória de lembrança ) e avançou para o homem, que por sua
vez armou-se de um espeto para churrasco.
E seguiu-se uma cena de esgrima, digna
dos melhores filmes de capa e espada.
O professor Maso ( ABAIXO ) , por ser mais velho e mais lerdo, ficou em desvantagem e
levou uma garfada na ' polpa ' .
Mas a humilhação maior foi quando o adversário
quebrou sua inseparável palmatória e ameaçou ( ABAIXO ) colocar as partes quebradas num
determinado local ( não pude ouvir direito onde ).
Claro, como sempre, sobrou pra mim. Se você encontrar algum termo mal escrito
neste texto, ' pesso ' que me desculpe, pois o ' profeçor ' Maso está de atestado de ' çaúde '
por uma ' çemana ' e me ' deichou ' na mão. " ( ABAIXO , OUTRO EXEMPLO DE PORTUGUÊS "PERFEITO " )
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