sexta-feira, 23 de outubro de 2015

Morada De Heróis

Vendo  aquela imagem no alto daquele morro imediatamente vêm a mente muitas coisas : as batalhas de que participou e os amigos que perdeu , visto que ele era militar ;





os amores , as desilusões e os entes queridos que deixou na distante pátria natal ; os momentos da despedida e da partida ;



 a longa e quase interminável viagem de 2 meses e 8 dias a bordo de um frágil navio veleiro  que atravessou a imensidão do oceano Atlântico , com todos os seus medos , desconfortos e perigos ;



a chegada e a imediata decepção com a nova terra cuja duríssima realidade



não condizia com aquela imagem maravilhosa que lhe disseram e venderam na Europa ; as minúsculas alegrias em meio a gigantescas dificuldades , como clima excessivamente quente e úmido , os perigos das desconhecidas e fatais doenças tropicais , os ataques de animais ferozes e peçonhentos e ainda possíveis ataques dos índios , antigos senhores daquela terra onde tudo ainda estava por fazer ; os sonhos e projetos que jamais se concretizaram na nova pátria ........Ele , à sua maneira , já havia contribuído para o desenvolvimento daquele minúsculo lugarejo



 há pouco surgido mas o seu destino era ser protagonista , mas não da maneira que ele queria : em 27 de dezembro de 1851  CARL AUGUST ANDREAS VON BUEROW , um ex-oficial da Marinha de SCHLESWIG-HOLSTEIN ( uma região de cultura predominantemente alemã , que até 1864 pertenceu à Dinamarca e que por várias lutou contra o domínio dinamarquês ) , de apenas 27 anos e que havia falecido no dia anterior era o primeiro a ser sepultado no que hoje chamamos de CEMITÉRIO DOS IMIGRANTES ( ABAIXO )



( a sepultura de Carl está bem no alto do morro e em sua lápide está esculpida uma âncora ) . A história de Carl não difere muito da daqueles pioneiros e sofridos heróis que foram enterrados ali ( ABAIXO )  sem glórias e reconhecimento algum : existem ali 490 sepulturas mas o número de sepultamentos realizados ali foi bem maior - estima-se que foram mais de 2.000 - e inclui moradores luso-brasileiros e até mesmo escravos !



Ao término do ano de 1851 a então colônia Dona Francisca tinha 389 moradores , sendo que da sua fundação até a morte de Carl , haviam acontecido 45 falecimentos : o primeiro falecimento aconteceu em 31 de março e foi de uma menina de apenas 2 anos chamada KATHARINA ENGEL ( ironicamente a palavra ENGEL significa ANJO , em alemão ) e houve um aumento considerável de falecimentos em virtude de uma epidemia de disenteria bacilar que teve início logo após a chegada da terceira leva de imigrantes , que veio a bordo do navio GLORIOSA , aportado em São Francisco do Sul em 27 de setembro de 1851 ( Carl August Andreas Von Buerow veio nesse mesmo navio ) . Como nos primeiros meses da colônia ainda não havia um local específico destinado aos enterros o jeito foi improvisar um cemitério :



ela localiza-se às margens do rio Mathias , no ponto em que esse cruzava a então PICADA DO JURAPÉ ( a atual rua NOVE DE MARÇO ) . Ficava na atual esquina entre as ruas Nove de Março e João Colin ( ABAIXO )  , mais especificamente no local onde está aquele velho prédio - inaugurado em 1927 - onde funciona a loja Apolo ( na época da construção desse prédio várias ossadas foram encontradas ali ) .



    A colônia só passou a ter oficialmente um cemitério após a chegada do pastor luterano JACOB DANIEL HOFFMAN : o terreno foi cedido pela SOCIEDADE HAMBURGUESA , empresa que loteou e colonizou Joinville  e era um morro localizado na então SCHWEIZER PIKADE ( Picada dos Suíços - ABAIXO ) , a atual rua XV DE NOVEMBRO .



 Era para ser um cemitério destinado aos luteranos mas como a quantidade de católicos residentes em Joinville era reduzidíssima (  daqueles 389 habitantes de 1851 , apenas 10 eram católicos ) esses também eram sepultados no cemitério , o que explica o fato de alguns não imigrantes terem sido lá enterrados . Os católicos de Joinville só passariam a ter um cemitério próprio a partir de outubro de 1870 e que , como adiantamos na semana passada ( LER O TEXTO " HISTÓRIA ESCONDIDA " , DE 13 DE OUTUBRO ) , era em um morro próximo a atual esquina entre a rua Ministro Calógeras e a avenida Juscelino Kubitschek . ( A CONSTRUÇÃO MAIOR DA FOTO ABAIXO É A ANTIGA CATEDRAL DE JOINVILLE  E EM CUJAS PROXIMIDADES ENCONTRAVA-SE O ANTIGO CEMITÉRIO )



 Tanto o cemitério luterano quanto o católico seriam desativados em novembro de 1913 : em 30 de novembro foi realizado o primeiro sepultamento no que é hoje o CEMITÉRIO MUNICIPAL ( ABAIXO )  e onde anteriormente existiu uma plantação de café .



 Mesmo assim o cemitério católico ainda existiu até agosto de 1930 , ocasião em que os restos mortais dos que estavam ali ainda enterrados foram transladados para o Cemitério Municipal ; já o último sepultamento no antigo cemitério luterano



 aconteceu em 1961 ; ali foram enterrados os restos mortais de MARTHA BERNER , falecida em São Paulo cinco anos antes . Em 1962 - como determinavam o bom senso , a memória e a história - o cemitério acabou sendo tombado pelo IPHAN ( Instituto de Patrimônio Histórico e Nacional ) e a antiga casa do coveiro ( ABAIXO )



 é hoje ocupada pela SOCIEDADE CULTURAL ALEMÃ DE JOINVILLE , entidade criada em 3 de outubro de 1999 . Lá também , esporadicamente , acontecem exposições e uma vez em cada mês e na manhã de um domingo , apresentações musicais , os chamados CONCERTOS MATINAIS . Talvez quem tenha melhor definido e sintetizado o que é o CEMITÉRIO DOS IMIGRANTES tenha sido a saudosa historiadora ELLY HERKENHOFF ( 1906-2004 - ABAIXO ) em discurso feito naquele local , em 3 de março de 1980 :



" Pisamos este chão sagrado com muito respeito e carinho , sabendo que são inúmeros os jazigos não identificáveis debaixo deste gramado nivelador , jazigos hoje irreconhecíveis , de gente como nós , gente que sofreu lutou , amou , gente que riu e que chorou e aqui descansa para a eternidade . " ........Um dos vídeos do dia é uma interessantíssima matéria feita pelo telejornal da TV RIC-RECORD a respeito desse verdadeiro patrimônio da cidade . VALE A PENA CONFERIR !




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